“... podemos conceber o conservadorismo como a defesa da manutenção da ordem social ou ordem política existente, em contraposição às forças que buscam a inovação...” (Renato Cancian – cientista político e doutor em ciências sociais)
Ao longo da história da humanidade, há de se constatar que as civilizações absorvem com muito pouco entusiasmo as novas idéias políticas que surgem da mente de alguns intelectualmente privilegiados, acadêmicos ou não. A tendência ao conservadorismo foi um dos maiores impulsos da Idade Média, legado que modelou toda a Idade Moderna e perdura com assaz energia na contemporaneidade. Mesmo depois de Rousseau, Marx, Proudhon e Darwin, parece que a humanidade ainda opta por Burke, Bonald e Maistre, uma vez ostentar um “sacrossanto horror à húbris revolucionária”, como apregoa Olavo de Carvalho.
Geralmente, o conservador defende a inalterabilidade das formas sociais, sem considerar a possibilidade das novas idéias e tendências substituírem as formas antigas pelo fato de serem, muitas vezes, frutos da ansiedade humana como um instinto primitivo e natural de se preservar. O conservador, indubitavelmente, caminha à estagnação intelectual, moral e espiritual, agarrando-se nas estruturas do seu atraso e no temor de macular seus “princípios” e práticas.
Em poucos períodos o conservadorismo foi tão oportuno como no atual momento histórico e econômico que vivenciamos. Educa-se a juventude com vistas somente a valorizar a tradição, assim oprimindo a intuição revolucionária dos miseráveis que diariamente são originados pelo sistema. Há uma disposição em se difundir que a classe naturalmente conservadora é a burguesia. De fato a burguesia, como nenhuma outra classe, apropriou-se tão bem de ideais aristocráticos, tratando de moldá-los em consonância com seus interesses de natureza macroeconômica. Assim a burguesia calcifica e confere valores tradicionais para a sociedade, controlando os meios de comunicação, as escolas, a produção artística, o poder público instituído etc. Sufoca invariavelmente intelectuais marginalizados que tentam, quase sempre sem sucesso, viver uma realidade alheia a essa tão antinatural e agressiva que é imposta pela classe dominante.
Paralelamente às questões financeiras, o pensamento conservador é responsável pela difusão de preconceitos de naturezas diversas. É nele que o racismo se ampara para defender teses absurdas de segregação de seres humanos com base na cor de sua cútis. É através desse pensamento anacrônico que se justifica mulheres possuírem uma carga horária de trabalho muitas vezes superior a dos homens e receberem indignos vencimentos, bem inferiores àqueles pagos a pessoas do sexo masculino. É ainda, através do pensamento conservador, que se dissemina a homofobia, práticas de violência contra pessoas cujo único pecado é amar de forma diferente. Por fim, é o conservadorismo próprio da mente de pessoas ignorantes que estreita o ápice e dilata a base da pirâmide social das diversas nações do planeta.
Dessa forma, as idéias conservadoras pautam nossas relações políticas, profissionais, pessoais, culturais, religiosas e sexuais, aprisionando-nos em práticas odiosas, vingativas, dando vazas à nossa altivez, ao nosso egoísmo e aos demais vícios humanos que cooperam para a involução de nossa espécie. O conservadorismo fecha-nos às idéias mais alucinadas, aos desejos mais devoradores, às tentações mais sedutoras, às práticas mais extravagantes e às depravações mais insanas, engaiolando-nos no inferno astral de nossas consciências, esse sim o inferno genuinamente implacável, bem diverso daquele que as religiões efêmeras pregam nas igrejas.
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