sexta-feira, 25 de outubro de 2013

À sombra do mau gosto*

Por Fernando Grecco
"Só há uma treva: a ignorância." (Shakespeare)
           
Algumas pessoas ainda não perceberam, mas é perfeitamente possível comer, tomar banho, ir à academia ou passear de carro com os amigos sem postar no facebook. Admitimos que, interessar-se em saber da rotina diária das pessoas, principalmente nas suas atividades mais sem importância, é certamente um sinal de uma enfermidade conhecida como ócio. Já a necessidade em exibir determinadas frivolidades pessoais do dia a dia é uma evidência clara do baixo nível a que fomos reduzidos.
Com a difusão das redes sociais foi possível observar (mais uma vez) o baixo nível ético e moral da sociedade brasileira, especialmente em cidades interioranas como Votorantim. Analisando os comentários, frases de efeito, fotos etc., que diariamente poluem as páginas da internet, vislumbram-se um espetáculo de idiotices de todos os gêneros. Não há marco limítrofe entre o razoável e o mau gosto extremo. O que vimos, diariamente, são piadas sem graça, vulgarização de mulheres, adultização infantil e comentários políticos que são dignos de pena.
Um elevado percentual de postagens refere-se a novelas, futebol, disseminação velada de preconceito étnico, sexual e religioso, além de frases de auto-ajuda que, de tão simplórias, não merecem sequer ser exemplificadas. Política, quando se fala, é com intuito de propagar as mesmices que ouvimos nas ruas. Nada de novo, pelo contrário, é tudo piorado já que a tecnologia nos permite ocultar a face e a verdadeira identidade, muitas vezes. É Lamentável. Se um dia acreditamos que a tecnologia facilitaria o contato com a ciência, robustecendo o espírito crítico e o nível cultural da população, isso se limitou à teoria.     
Às mulheres atraentes, esboçadas em academias, as redes sociais funcionam como um palco para exibicionismos baratos. Não há limites para a trivialidade e para a baixeza, para a necessidade suprema em ser observada, desejada e comentada. A isso, boa parte das pessoas dedica-se horas de suas vidas em um narcisismo infantil, frustrado e desprovido de qualquer sensualidade. Ao homem, cada dia mais distante de uma formação pessoal crítica, restou falar de futebol, mulher ou cerveja. A caracterização masculina, instintiva, perdeu o sentido, dando lugar a um modelo tão caricato que a essência masculina não mais se reconhece.  
Outro dado curioso é que, ao observamos a realidade dentro das redes sociais, parece reinar uma felicidade plena na vida dos internautas, como se eles não vivenciassem um mundo dominado por intempéries políticas, sociais e econômicas. Transmitem, de maneira bastante impostora, que são tomados por elevados sentimentos humanos, como a compaixão e lealdade, além de serem fiéis seguidores de princípios teológicos que poucos ousariam divergir. A falsidade é muito grande.  
Imaginamos uma sociedade que utilize a facilidade da comunicação via internet para se voltar única e exclusivamente aos nossos problemas essenciais. Fome, miséria, violência, racismo, doenças e degradação ambiental. Não reconhecemos esses temas nas redes sociais. Eles são, por sua vez, tão estranhos à maioria dos internautas que perderam inteiramente o sentido. 

*Artigo publicado originalmente para a edição da Folha de Votorantim de 25/10/2013.

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